segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Três palavras...

"A vida é uma peça na qual  somos todos atores coadjuvantes que,  desconhecendo o roteiro e o final, precisam intuir a hora certa de entrar e sair de cena com dignidade."  

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Vim ao mundo em 1934 e o fato foi resumido numa primeira e única palavra: Nasci,  alardeava com originalidade o cartão de participação. Em 2014, oito décadas depois, a jornada resultante desse feito poderia ser também sintetizada numa segunda e singela palavra - Vivi, significando um resumo das expectativas iniciais. Já a terceira e óbvia última palavra cabe aos pósteros divulgar...

Quando abri os olhos pela primeira vez o país era governado por Getúlio Vargas e se assustava com a ameaça da  Segunda  Guerra Mundial, conflito que significou grande transtorno para a família, pois sendo meu Pai oficial da reserva foi convocado para servir ao Exército. Isso implicou em nossa mudança para Belo Horizonte onde, em 1942, a vida era complicada para todos e faltava tudo, desde energia elétrica a papel higiênico, enquanto sobravam mosquitos nos ares e escorpiões proliferavam alegremente no depósito de lenha. Sim, o fogão era a lenha e banho de água quente dependia da hora do almoço.

No ano seguinte voltei sozinho para o Rio a convite dos proprietários  do Colégio Anglo-Americano, onde meu Pai era professor licenciado, para participar do concurso de admissão ao Colégio Militar. Foi uma deferência que me permitiu fechar a  década inicial da vida com dois sucessos no currículo, a aprovação no concurso e o precoce aprendizado da língua inglesa. Em maio de 1945 termina o conflito mundial e em outubro o presidente Getúlio Vargas é deposto, eventos que seriam meu primeiro contato com a política nacional e o caudilho gaúcho, mas nossos caminhos voltariam a se cruzar em agosto de 1954, eu na Escola Naval e ele num caixão rumo a São Borja. No ano seguinte admito minha inadequação à carreira militar e me desligo da Escola Naval, fechando a segunda década com aquela que se revelou a mais acertada das decisões.

Fui ao mercado de trabalho com experiência zero e currículo rarefeito, onde apenas constavam conhecimentos de línguas estrangeiras - o inseguro francês da Aliança Francesa e o sólido inglês da Cultura Inglesa. Pouco, mas suficiente para garantir o primeiro emprego num grupo multinacional e embasar tudo o que aprendi na área empresarial. Em sequência fiz concurso para o Banco do Brasil e passei, lá cumprindo mais três décadas de atividades prazerosas em múltiplas áreas.

Fim de ciclo e início da quinta década, aposentadoria conquistada, o destino foi então Angra dos Reis. No balneário nos divertimos por tempos com uma pequena pousada, uma imobiliária e a companhia dos familiares que seguiram nossas pegadas e lá permanecem até hoje. Alegrias compartilhadas com Teresópolis e os familiares estabelecidos na tranquilidade serrana, tendo no centro de tudo a frenética Copacabana de sempre.

Iniciamos agora, eu e minha mulher, a oitava e provavelmente derradeira década de existência, com uma caminhada de duração e passos incertos rumo ao que pretendemos sejam os melhores anos do resto de nossas vidas, com a certeza que tudo valeu a pena pois nossas almas não foram pequenas; só importa agora o tempo que ainda poderemos dedicar um ao outro, e ambos aos filhos, netos e bisnetos. Se a vida é mesmo uma peça, como dito, acreditamos ter desempenhado nossos papeis com garra e dignidade e assim pretendemos atuar até o baixar definitivo das cortinas.



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