quinta-feira, 22 de junho de 2017

Vices: de Jango a Temer

Em março de 1964 eu tinha redondos trinta anos e estava em um bonde a caminho do trabalho quando ouvi um jornaleiro apregoando a manchete do dia - Jânio Quadros renunciara e a posse do seu vice João Goulart, em viagem no exterior, estava sendo questionada. Nos dias seguintes instalou-se o caos político, administrativo e hierárquico no país, com os movimentos esquerdistas tentando empalmar a condução dos destinos nacionais. Fiquei especialmente assustado com as imagens de João Goulart aceitando ser festejado por soldados e sargentos amotinados, nos salões do Automóvel Clube do Brasíl. A mobilização popular pela democracia e restauração da ordem que se seguiu deu-se pelas várias Marchas da Família e culminou na deposição do presidente pelos militares, iniciando uma ditadura que durou 21 anos, fez alguns estragos nos direitos humanos dos terroristas que a combateram, notabilizou-se por gerar o chamado Milagre Econômico e auto encerrou-se por esgotamento do modelo.
Desde a proclamação da República o Brasil tem uma história conturbada de vices que assumiram a presidência, sob os mais variados motivos, e até 1964 Floriano Peixoto, Nilo Peçanha, Delfim Moreira e Café Filho tinham sido elevados a primeiros mandatários durante seus mandatos. Já o regime militar começou, decorreu e acabou balizado por incidentes envolvendo os vice-presidentes do país, sendo João Goulart o primeiro a ascender de coadjuvante a protagonista eventual nessa nova fase, por força das artes e artimanhas do destino. A ele se seguiram em intensidade variável Pedro Aleixo, Aureliano Chaves e já na redemocratização José Sarney, Itamar Franco e Michel Temer - este último vivendo contestação tão acirrada quanto Jango, embora por motivos diversos.
Já se disse muitas vezes que nada acontece por acaso e que a história se repete como farsa, mas se a anarquia do curto período João Goulart justificou a intervenção militar e tudo que aconteceu de economicamente positivo depois, o que nos reservaria de bom o desdobramento dessa imensa crise moral, administrativa, institucional e ética que marca a infeliz passagem do vice Michel Temer pelo Planalto?